Tuesday, January 26, 2010

Paris II


Paris I


Valencia


Milan


Sunday, January 17, 2010

Sorolla

In Valencia, I finally managed to see the exhibition of Joaquin Sorolla, "Visions of Spain", the huge paintings depicting the various Spanish regions which he created for the Hispanic Society in New York circa 1911. This exhibition toured Spain the whole of last year, drawing huge enthusiastic crowds. It is easy to understand why. Sorolla was a virtuoso and he depicted Spain, in a blaze of color and sunlight, in a kind of late impressionist dash pompier style far removed from the modernist trends already current in Paris. Even then, he was a hugely popular painter, who accumulated a vast fortune. He may not have secured for himself a proeminent place in art history, but his paintings, always verging on - if not downright splashing in - kitsch can, nevertheless, be hugely attractive and enjoyable. What an amazing capacity he had to capture light and water - see his amazing painting on tuna fishing - and to draw characters with simple, fluid brushstrokes! As a painter friend of mine said, how is it possible to be so good and so bad at the same time!

Sunday, January 3, 2010

Herberto Helder

Last but not least, Herberto Helder, probably the greatest portuguese poet after Pessoa in the twentieth century. Herberto Helder comes from the surrealist tradition but his voice is entirely original; his language is hallucinatory, of a convulsive, incantatory and obscure beauty. He is the prototype of the inspired poet, in touch with the Gods. He is also the author of an outstanding collection of short stories of an autobiographical nature, about the time he spent in Brussels in exile, called Os Passos em Volta. He had an enormous influence in the most recent generation of Portuguese poets. These are the first verses of a long erotic poem from his first collection of poetry, "O Amor em Visita", published in 1958

O AMOR EM VISITA

Dai-me uma jovem mulher com sua harpa de sombra
e seu arbusto de sangue. Com ela
encantarei a noite.
Dai-me uma folha viva de erva, uma mulher.
Seus ombros beijarei, a pedra pequena
do sorriso de um momento.
Mulher quase incriada, mas com a gravidade
de dois seios, com o peso lúbrico e triste
da boca. Seus ombros beijarei.

Cantar? Longamente cantar.
Uma mulher com quem beber e morrer.
Quando fora se abrir o instinto da noite e uma ave
o atravessar trespassada por um grito marítimo
e o pão for invadido pelas ondas -
seu corpo arderá mansamente sob os meus olhos palpitantes:
Ele - imagem vertiginosa e alta de um certo pensamento
de alegria e de impudor.
Seu corpo arderá para mim
sobre um lençol mordido por flores com água.

Em cada mulher existe uma morte silenciosa.
E enquanto o dorso imagina, sob os dedos,
os bordões da melodia,
a morte sobe pelos dedos, navega o sangue,
desfaz-se em embriaguez dentro do coração faminto.
- Oh cabra no vento e na urze, mulher nua sob
as mãos, mulher de ventre escarlate onde o sal põe o espírito,
mulher de pés no branco, transportadora da morte e da alegria.

Dai-me uma mulher tão nova como a resina
e o cheiro da terra:
Com uma flecha em meu flanco, cantarei.
E enquanto manar de minha carne uma videira de sangue,
cantarei seu sorriso ardendo,
suas mamas de pura substância,
a curva quente dos cabelos.
Beberei sua boca, para depois cantar a morte
e a alegria da morte.

Dai-me um torso dobrado pela música, um ligeiro
pescoço de planta,
onde uma chama comece a florir o espírito.
À tona da sua face se moverão as águas,
dentro da sua face estará a pedra da noite.
-Então cantarei a exaltante alegria da morte

(.....)

(O Amor em Visita, 1958)

Saturday, January 2, 2010

Alexandre O'Neil

He was a caustic voice. He wrote a handful of poems which became instant classics, anthems for his generation. He had a gift for catchy formulas, which he put to good use in advertising, his trade. His 1965 take on Portugal, "questão que eu tenho comigo mesmo", offers a nice contrast with Sophia's.

PORTUGAL

Ó Portugal, se fosses só três sílabas,
linda vista para o mar,
Minho verde, Algarve de cal,
jerico rapando o espinhaço da terra,
surdo e miudinho,
moinho a braços com um vento
testarudo, mas embolado e, afinal, amigo,
se fosses só o sal, o sol, o sul
o ladino pardal,
o manso boi coloquial,
a rechinante sardinha,
a desancada varina,
o plumitivo ladrilhado de lindos adjectivos,
a muda queixa amendoada
duns olhos pestanítidos,
se fosses só a cegarrega do estio, dos estilos,
o ferrugento cão asmático das praias,
o grilo engaiolado, a grila no lábio,
o calendário na parede, o emblema na lapela,
ó Portugal, se fosses só três sílabas
de plástico, que era mais barato!

*

Doceiras de Amarante, barristas de Barcelos,
rendeiras de Viana, toureiros da Golegã,
não há "papo-de-anjo" que seja o meu derriço,
galo que cante a cores na minha prateleira,
alvura arrendada para o meu devaneio,
bandarilha que possa enfeitar-me o cachaço.
Portugal: questão que eu tenho comigo mesmo,
golpe até ao osso, fome sem entretém,
perdigueiro marrado e sem narizes, sem perdizes,
rocim engraxado,
feira cabisbaixa,
meu remorso,
meu remorso de todos nós...

(Feira Cabisbaixa, 1965)

Jorge de Sena

Poet, essayist, author of one the best novels published in Portugal in the twentieth century (Sinais de Fogo), Jorge de Sena lived most of his life in self-imposed exile, in the University of Santa Barbara in Southern California. His poetry is intellectual, sometimes difficult and demanding. His voice is at times harsh, resentful. He was very aware of his greatness and often thought others, specially in Portugal, not sufficiently so. This is one of his better known poems, "Carta a Meus Filhos sobre os Fuzilamentos de Goya", written in Lisbon in June 1959.

CARTA A MEUS FILHOS SOBRE OS FUZILAMENTOS DE GOYA

Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso.
É possível, porque tudo é possível, que ele seja
aquele que eu desejo para vós. Um simples mundo,
onde tudo tenha apenas a dificuldade que advém
de nada haver que não seja simples e natural.
Um mundo em que tudo seja permitido,
conforme o vosso gosto, o vosso anseio, o vosso prazer,
o vosso respeito pelos outros, o respeito dos outros por vós.
E é possível que não seja isto, nem sequer seja isto
o que vos interesse para viver. Tudo é possível,
ainda quando lutemos, como devemos lutar,
por quanto nos pareça a liberdade e a justiça,
ou mais que qualquer delas uma fiel
dedicação à honra de estar vivo.
Um dia sabereis que mais que a humanidade
não tem conta o número dos que pensaram assim,
amaram o seu semelhante no que ele tinha de único,
de insólito, de livre, de diferente,
e foram sacrificados, torturados, espancados,
e entregues hipocritamente à secular justiça,
para que os liquidasse "com suma piedade e sem efusão de sangue."
Por serem fiéis a um deus, a um pensamento,
a uma pátria, uma esperança, ou muito apenas
à fome irrespondível que lhe roía as entranhas,
foram estripados, esfolados, queimados, gaseados,
e os seus corpos amontoados tão anonimamente quanto haviam vivido,
ou suas cinzas dispersas para que delas não restasse memória.
Às vezes, por serem de uma raça, outras
por serem de uma classe, expiaram todos
os erros que não tinham cometido ou não tinham consciência
de haver cometido. Mas também aconteceu
e acontece que não foram mortos:
Houve sempre infinitas maneiras de prevalecer,
aniquilando mansamente, delicadamente,
por ínvios caminhos quais se diz que são ínvios os de Deus.
Estes fuzilamentos, este heroísmo, este horror,
foi uma coisa, entre mil, acontecida em Espanha
há mais de um século e que por violenta e injusta
ofendeu o coração de um pintor chamado Goya,
que tinha um coração muito grande, cheio de fúria
e de amor. Mas isto nada é, meus filhos.
Apenas um episódio, um episódio breve,
nesta cadeia de que sois um elo (ou não sereis)
de ferro e de suor e sangue e algum sémen
a caminho do mundo que vos sonho.
Acreditai que nenhum mundo, que nada nem ninguém
vale mais que uma alegria ou a alegria de tê-la.
É isto que mais importa - essa alegria.
Acreditai que a dignidade em que hão de falar-vos tanto
não é senão essa alegria que vem
de estar-se vivo e sabendo que nenhuma vez
alguém está menos vivo ou sofre ou morre
para que um só de vós resista um pouco mais
à morte que é de todos e virá.
Que tudo isto sabereis serenamente,
sem culpas a ninguém, sem terror, sem ambição,
e sobretudo sem desapego ou indiferença,
ardentemente espero. Tanto sangue,
tanta dor, tanta angústia, um dia
- mesmo que o tédio de um mundo feliz vos persiga -
não hão de ser em vão. Confesso que
muitas vezes, pensando no horror de tantos séculos
de opressão e crueldade, hesito por momentos
e uma amargura me submerge inconsolável.
Serão ou não em vão? Mas, mesmo que não o sejam,
quem ressuscita esses milhões, quem restitui
não só a vida, mas tudo o que lhes foi tirado?
Nenhum Juízo Final, meus filhos, pode dar-lhes
aquele instante que não viveram, aquele objecto
que não fruíram, aquele gesto
de amor, que fariam "amanhã".
E, por isso, o mesmo mundo que criemos
nos cumpre tê-lo com cuidado, como coisa
que não é nossa, que nos é cedida
para a guardarmos respeitosamente
em memória do sangue que nos corre nas veias,
da nossa carne que foi outra, do amor que
outros não amaram porque lho roubaram.


(Metamorfoses, 1963)

Sophia de Mello Breyner Andresen

Sophia de Mello Breyner had a limpid, economical, precise and musical style, in which every word shines and weighs and none is out of place. She was in many ways a classical poet. She captured the light - of her beloved Greece but also the different more intense Atlantic light of Portugal - and the shadow; she was in touch with the elements; and she had a strong moral voice, which she used effectively in opposition to Salazar's dictatorship. This is "Pátria", her take on Portugal in 1962:

PÁTRIA

Por um país de pedra e vento duro
Por um país de luz perfeita e clara
Pelo negro da terra e pelo branco do muro

Pelos rostos de silêncio e de paciência
Que a miséria longamente desenhou
Rente aos ossos com toda a exactidão
Dum longo relatório irrecusável

E pelos rostos iguais ao sol e ao vento

E pela limpidez das tão amadas
Palavras sempre ditas com paixão
Pela cor e pelo peso das palavras
Pelo concreto silêncio limpo das palavras
Donde se erguem as coisas nomeadas
Pela nudez das palavras deslumbradas

- Pedra rio vento casa
Pranto dia canto alento
Espaço raiz e água
Ó minha pátria e meu centro

Me dói a lua me soluça o mar
E o exílio se inscreve em pleno tempo
(Livro Sexto, 1962)

Friday, January 1, 2010

Siglo de Oro

The Spaniards invented the concept of the "Siglo de Oro" to designate their most glorious cultural period (which in fact runs over almost two centuries, the sixteenth and most of the seventeenth) whose greatest figures were writers like Cervantes or Lope de Vega, poets like Quevedo, Gongora or San Juan de la Cruz and painters like Velazquez or Murillo. In Portugal, we are now also inventing our own "Século de Ouro", in this case the twentieth century when several generations of poets raised the level of Portuguese literature to a very great height. Everybody knows Fernando Pessoa, the greatest portuguese poet of the century and, with Luis de Camões, one of the greatest ever; but by no means was he the only extraordinary poet to appear in Portugal: Jorge de Sena, Sophia de Mello Breyner, Alexandre O'Neill, the incomparable Herberto Helder, to name just a few of my favorites (and there are many others) will surely have their place in the literary canon of the century. Examples to follow in the next posts.